O presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), conselheiro Sérgio Ricardo, determinou, durante a aula inaugural da capacitação “É da Nossa Conta: Orçamento Mulher”, a notificação das 142 prefeituras do estado quanto à obrigatoriedade da prestação de contas sobre as políticas públicas direcionadas às mulheres nos municípios. O evento, realizado nesta terça-feira (25) no auditório da Escola Superior de Contas, marcou o início de um projeto de fiscalização que visa acompanhar as ações e os investimentos municipais voltados à melhoria da vida das mulheres.
Sérgio Ricardo explicou a importância dessa medida no contexto de um estado que lidera índices alarmantes de feminicídio e violência contra a mulher. “Queremos saber qual a política para as mulheres que foi implementada em cada município. Cada prefeito terá que explicar o que fez, o que não fez e por que não fez. Isso não se restringe apenas à segurança da mulher, mas abrange temas como geração de emprego, qualificação profissional e saúde”, afirmou.
O presidente do TCE-MT também destacou que, no ano anterior, havia solicitado uma Auditoria Operacional sobre Violência Contra a Mulher, a fim de conhecer a realidade da situação da mulher em Mato Grosso. O relatório obtido foi descrito como “lamentável” e revelou a falta de políticas públicas eficazes para a proteção e o bem-estar das mulheres. “Somos campeões em feminicídio porque não temos políticas públicas reais. Praticamente nenhum município possui delegacia da mulher, e mais de 51% da população de Mato Grosso é composta por mulheres, mas as políticas ainda são predominantemente voltadas para os homens.”
Emocionada, a presidente da Associação de Mulheres da Carreira Jurídica (ABMCJ) e parceira do evento, defensora pública Tânia Regina de Mattos, agradeceu ao presidente Sérgio Ricardo pela iniciativa de inserir a política pública para mulheres como ponto de controle nas contas anuais. “Sem dúvida alguma, isso se tornará um divisor de água na vida das mulheres”, salientou, enfatizando a importância da capacitação para planejar orçamentos de forma acessível, de modo que lideranças femininas possam participar ativamente do debate.
Ana Emília Sotero, coordenadora da ABMCJ na Região Centro-Oeste, ressaltou a principal dificuldade enfrentada pelos municípios ao desenvolver políticas públicas para as mulheres: a falta de recursos. “Sem orçamento, não há política pública principalmente para mulheres, porque quando gestores precisam cortar despesas, a primeira coisa que fazem é extinguir as estruturas dedicadas às políticas para as mulheres, essa é nossa triste realidade. Temos 142 municípios, somos um estado rico e temos duas delegacias especializadas em atendimento à mulher e uma que funciona 24 horas.”

A defensora pública-geral de Mato Grosso, Maria Luziane Ribeiro de Castro, reforçou a relevância da capacitação oferecida, destacando que é essencial contar com profissionais preparados para cobrar a implementação de políticas públicas eficazes. “Para que as políticas realmente cheguem à ponta, é preciso garantir o financiamento adequado, e isso só será possível se houver uma rede de pessoas capacitadas para entender e atuar sobre o orçamento.”

Representando o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), a vice-diretora da Escola Superior da Magistratura, desembargadora Anglizey Solivan de Oliveira, também elogiou a iniciativa do TCE-MT. “É exatamente do encontro e da discussão que boas ideias e soluções nascem. Minha bandeira e luta é sobre capacitação técnica e cientifica de mulheres, quando nos propomos a uma carreira precisamos estar habilitadas a sentar, tomar decisões e sermos relevantes, nós temos que ascender pelos nossos méritos. Por isso a reverência que faço a esse encontro tão importante para o exercício de algo tão importante e que a sociedade não entende como sendo para mulher, que é orçamento.”

Em nome da Assembleia Legislativa, o deputado Beto Dois a Um destacou o papel crucial do orçamento mulher no avanço da igualdade de gênero. “Acredito que, com um orçamento específico para políticas públicas direcionadas às mulheres, conseguiremos promover uma sociedade mais justa e equilibrada, reparando desigualdades históricas”, disse.
Coordenadora da Auditoria Operacional sobre Violência Contra a Mulher, a auditora pública Simony Jin salientou que o debate sobre orçamento mulher é um desdobramento da fiscalização realizada pelo Tribunal de Contas. “Depois dessa auditoria, eu vejo que na prática nós temos poucas políticas públicas que seguem um roteiro de planejamento que deveriam seguir, que são construídas em cima de dados sólidos, consistentes, confiáveis. Não é assim que funciona, elas são implementadas muito mais por vontade política, sem planejamento e planejamento é fundamental para que uma boa política pública perdure no tempo independentemente de vontade política. Quando ela é construída como deveria, independentemente do governo que ali está, ela tem mais chances de continuar, de se consolidar dentro do orçamento e por isso a importância desse curso.”

Também compuseram o dispositivo de honra a 1ª vice-presidente da Câmara de Cuiabá, vereadora Maysa Leão, a prefeita de Várzea Grande, Flávia Moretti, a promotora de Justiça, Giliade Pereira de Souza Maia, a secretária da Mulher de Cuiabá, Ten. Cel Haddassah Suzannah, a presidente da BPW Várzea Grande, Cláudia Magnani, a delegada de Polícia e coordenadora de enfrentamento à violência contra a mulher, Mariel Antonini, a subprocuradora da Mulher da ALMT, Francielle Brustolin.
É da Nossa Conta: Orçamento Mulher
Após o encontro inaugural, a capacitação continuará na modalidade de ensino a distância, com cinco encontros semanais programados para os dias 2, 9, 16, 23 e 30 de abril. O curso contará com a participação de representantes de associações, conselhos municipais e estadual da mulher, servidores públicos, estudantes e pesquisadores interessados na temática. Cada encontro abordará um tema específico, incluindo noções gerais sobre orçamento público, a inserção da mulher no orçamento, auditorias operacionais realizadas pelo TCE-MT, ferramentas de fiscalização e controle social, além da avaliação de políticas públicas.